- Você tem certeza do que você está fazendo? – Perguntou ela, ainda duvidando que agora fosse verdade.
- Não! Não tenho certeza. Não sei se te quero, mas agora não posso remoer amores passados.
- Então porque faz isso comigo? Não tem medo de me magoar?
- Tenho.
Mal sabia ela que o maior medo que ele sentia era o medo de não se arrepender. Era mártir. Adorava sofrer. Fazia-lhe bem.
- Começos de relacionamentos não deveriam ser melancólicos – murmurou ela, com um ligeiro desespero.
- Tudo deve ser melancólico. “Melancolia é que dá ibope” – Disse ele cantarolando e esbanjando um ar jocoso, como quem não se importava. Importava-se. Tremia e suava frio.
- Pare com isso. Você sabe que eu falo sério. Sou louca por você.
- Eu também falo sério. Não quero te deixar. Nunca mais...
Mal percebia que suas mentiras iam crescendo e que, numa encruzilhada, tomara o caminho errado e a cada segundo, se afastava mais e mais da rota que, realmente, lhe pertencia.
- Você não a esqueceu. Eu sei. Mas eu vou fazer você esquecê-la.
Ele rira por dentro: Como tão tolo comentário ainda podia ser dito? Nascera na década de oitenta. Acreditava em sentimentos que as novelas ainda não reproduziam. Acreditava em amor condicional, em sexo casual, em noites perdidas, em aparências. Acreditava no poder da falsidade, na força das lágrimas e na eficiência da melancolia.
- No que você está pensando? – Perguntou ela com aspecto curioso.
- Nas coisas que eu acabei de deixar para trás.
- Ela?
- Sim.
- Algum dia você vai gostar de mim como você gostou dela?
- Não sei. É possível. “Pode ser que o barco vire... Também pode ser que não” – Ele riu mais uma vez.
- Não sei como você acha graça nisso. Não entendo como ela ainda pode te fazer bem.
- Ela não me faz bem. Ela me faz mal. Mas eu gosto mesmo assim. Desde o tempo em que estávamos juntos.
- Passado...
- Tudo bem. Já não quero mais discutir isso “o imperfeito não participa do (meu) passado”
Ela enfureceu-se. Ruborizou-se e com voz de fogo disse:
- Eu não suporto mais essas músicas. Fale-me alguma coisa sua, fale alguma coisa criada na sua cabeça. Diga-me algo que te pertença...
Ele a olhou no fundo dos olhos, como raras vezes fizera antes e disse:
- Faça por merecer...