terça-feira, 27 de novembro de 2007

Futuros Incertos

Lera para ela mais um de seus contos. Aquele que falava sobre a realidade. Aquele que o qualificava como burocrarazinho intitulado, benevolentemente, de conciliador.


O silêncio era mórbido. Já começava a pensar que não havia sido uma das suas melhores idéias. Enquanto ela relia o conto em voz baixa, ele pensava nas palavras que havia usado naquele conto. Definitivamente tinha que encontrar um sinônimo para “outrora”. Se um desajuizado algum dia tivesse a idéia de compilar seus contos em um só livro, esse livro com certeza se chamaria: Outrora.


Por que procurar outras palavras? “Outrora” dava um sentido lusitano. Meio erudito. Exatamente o que gostaria de passar


Ela havia terminado a leitura. Rira uma ou duas vezes enquanto se deliciava com aquele punhado de bobagens que ali estavam escritas.


- Gostei muito da forma como você me definiu. Disse ela rindo – como sempre.


- Que forma? Desculpe-me se tentei te definir com minhas palavras pobres. Nunca foi minha intenção;


- Não se desculpe. Nunca haviam me chamado de “garota doutro lado das montanhas. De depois das estradas sinuosas, de uma cidade incrustada num vale.” Achei bastante poético.


O silencio fez-se mórbido mais uma vez.


- Só gostou da minha “definição de você”? Perguntou ele com um ar pesado de descontentamento.


- Claro que não. Gostei muito da forma como você se lembrou de mim. Se este conto narra a verdade, você lembrou-se de mim muito rápido


- Não me lembrei de você. Lembrei-me de nós!


- Por favor, não comece! Achei que tudo isso já estava superado. Você esta praticamente casado, e eu estou muito feliz com meu novo amor. Ainda por cima, este conto já tem quase 10 anos. Não é possível que este final ainda reflita alguma realidade.


- Me desculpe, faz anos que eu não leio este conto. O que diz na parte final?


- Beijaria...


- Sim, agora me lembro. Ainda me recordo daquela tarde como se fosse ontem. Você disse que está feliz. Está mais feliz com ele do que foi comigo?


- Por favor, não me faça essa pergunta.


- Você tem medo de buscar a resposta dentro de você mesma?


- Por favor. Pare!


- Qual é o seu problema? Tem medo de admitir que tivemos mais do que “um amor” de verão?


- Não sei bem o que tivemos, mas seja lá o que tenha sido não existe mais...


Foram algumas das palavras mais cortantes que já escutara até então. Poucas vezes experimentara essa sensação de estar totalmente entregue à loucura de outra.
Pela terceira vez fez-se silencio. Dessa vez o silencio era fúnebre.


- Vou embora – disse ela – tenho outras coisas pra fazer.


- Não minta. Quando você mente suas bochechas ficam coradas, e seus lábios ficam secos... Não combina com você!


- Pois bem. Vou me encontrar com meu namorado. Marcamos de almoçar hoje.


- De posse da verdade, posso te pedir que fique?


- Por favor, não me peça isso.


- Por que não?


- Porque há 10 anos eu lhe pedi que não fosse, mas você não me escutou. Então eu abençoei sua ida e rezei para que voltasse. O que nunca aconteceu.


- Tente me entender! Éramos muito jovens. Você morava em outra cidade. Eu era irresponsável, inconseqüente...


- Sim, concordo. Agora somos muito velhos, responsáveis e conseqüentes. Não podemos nos dar ao luxo de nos jogar ao acaso mais uma vez.


Olhou aflita no relógio e viu que já passava de uma da tarde.


- Desculpe, não posso ficar mais. Realmente tenho que ir.


- Mas você volta?


- Não


- Por quê?


- Acho que já discutimos bastante sobre isso...


Ele não tinha mais argumentos. Ela levantou bruscamente da cama, vestiu-se, pegou sua bolsa e saiu pela porta da frente, deixando-o, para sempre.

2 comentários:

Jeniffer Santos disse...

é...
"nós só damos valor as coisas ou pessoas qdo a perdemos "

essa frase diz mt.

beijos ^^

Unknown disse...

Nada de valorizaçao tardia..
Eh nostalgia mesmo.